quarta-feira, 5 de novembro de 2008

O novo proletariado

Jerónimo de Sousa, do PCP, acaba agora mesmo de defender no Parlamento as pequenas empresas, que são fustigadas pelo Estado. Neste país miserável, os pequenos empresários já são o novo proletariado.

sábado, 17 de maio de 2008

Legislar a ortografia? II

Escreve Miguel Madeira, num comentário n' O Insurgente

Mas a ortografia já está legislada - a única coisa que este acordo faz é trocar uma “lei” por outra (em certo sentido, como o acordo determina que as anteriores normas ortográficas continuam a ser aceitáveis, ele até “des-legisla” a ortografia).

Ao que respondi:

Caro Miguel Madeira

A crítica que faço ao facto de se legislar a ortografia também se aplica ao estado actual, claro. Fiquei sem perceber se você é a favor ou não de se regular a ortografia por lei. Mas quer se seja a favor ou contra isso, pode-se rejeitar esta reforma ortográfica por ser artificial e imposta sem consultar o povo. Por exemplo, é possível ser a favor da legislação ortográfica mas defender que ela se deve basear na norma que emerge do uso da língua. Pode-se ainda ser a favor da regulação ortográfica mas apenas se as reformas forem graduais. Não é a minha posição, como penso que ficou claro.

Mas se se é contra a legislação ortográfica então é-se necessariamente contra esta reforma. É que se a legislação ortográfica é um mal, uma reforma ortográfica artificial e centralista é ainda pior: de facto esta é uma consequência daquela (explico melhor em baixo).

Os políticos alteraram profundamente a ortografia em 1911 numa altura em que isso não afectava grande parte da população precisamente por ser analfabeta. Desde então, as reformas foram mínimas, o número de alfabetizados cresceu enormemente e essa grafia artificial (que está muito longe de ser perfeita; as regras de acentuação, por exemplo, parecem-me fracas) foi aprendida e usada por muita gente que a adoptou como sua. Agora, porque meia dúzia de iluminados pensa que a língua portuguesa vai ser o Quinto Império, querem mudar a ortografia à força, como em 1911. E olhe que há por aí muitos defensores do Acordo que o criticam por ser muito pouco ambicioso, que queriam uma escrita fonética (algo impossível, mesmo teoricamente, e se quiser explico-lhe porquê), que queriam alterar profundamente a grafia. Alterar a forma de escrever das pessoas por decreto é ilegítimo, inútil, violento, e potencialmente causador de desnormatização, precisamente o contrário do pretendido. Isto é uma consequência do facto de se regular a ortografia: impedem-se ou dificultam-se as mudanças naturais, progressivas, sedimentadas e desejadas pela comunidade falante e incentiva-se assim a mudanças administrativas periódicas que vão desagradar a muitos e prejudicar a sua vida. Diz-me que é apenas mudar uma lei por outra, como se isso fosse pouca coisa. Mudar uma lei que afecta toda a gente no seu dia-a-dia é algo em si mesmo indesejável. Era preferível que não houvesse lei nenhuma. Se é inútil, para quê, então?

A estabilidade gráfica é algo naturalmente desejado por comunidades numerosas de falantes, precisamente porque contribui para a boa comunicação, para a melhor aprendizagem das normas gráficas, para a continuidade do património literário e para a poupança de custos de adaptação quer dos textos quer das pessoas. Deixe-se a comunidade em liberdade e dessa liberdade resultará ou uma estabilidade, ou uma evolução; mas qualquer que seja o resultado, esse será o que melhor se adequa às necessidades dos falantes.

Como escrevi [aqui], este é o principal motivo por que me oponho ao Acordo, mas os meus motivos são muitos mais. Quando tiver mais tempo, expô-los-ei [cá].

«(…) o acordo determina que as anteriores normas ortográficas continuam a ser aceitáveis»

Onde é que o Acordo prevê que as formas antigas continuam a ser aceites? Tanto quanto eu saiba, com o Acordo, "óptimo", por exemplo, passa a ser oficialmente errado (haverá coisa mais ridícula?), e apenas "ótimo" será aceite (ou aceito, como dizem os brasileiros…)

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Legislar a ortografia?

Além de não reconhecer validade aos argumentos dos apologistas do Acordo Ortográfico, oponho-me a ele antes de tudo porque sou contra a ingerência estatal na ortografia; esta não deve ser objecto de legislação, pelos mesmos motivos por que não deve haver uma lei que defina o que é gramaticalmente correcto. Assim como os gramáticos e linguistas registam e sistematizam os usos linguísticos dum povo, seleccionando o que há de melhor ou mais representativo, dando relevância à norma culta, à expressão da língua na literatura, também os mesmos estudiosos deviam proceder analogamente quanto à grafia das palavras. É isto que acontece com a língua internacional actual de facto, o Inglês. Não há nenhuma academia britânica supervisionando a língua, como acontece com o Espanhol ou o Francês. E, no entanto, não há nenhuma selva ortográfica no Inglês, ao contrário do que a maioria pensa que acontece quando a ortografia não é regulada por lei. Aliás, penso que esta ausência de regulação é um factor de dinamismo e vitalidade da língua inglesa. Todos os anos, milhares de palavras novas surgem no vastíssimo léxico inglês. Como é que isto seria possível se tivessem de passar pelo crivo burocrático dum comité linguístico como uma Academia de Ciências de Lisboa, que demorou centenas de anos de azurradas para editar o seu dicionário — 15 anos para a letra A em 1793, talvez outros tantos para um novo volume para a letra A em 1976 e agora mais 13 anos para a versão completa de 2001? Não se vê como.

«Então como surge uma ortografia se não houver uma lei ou autoridade central que a imponha?», pergunta o típico português, de mentalidade estatista, que não concebe vida fora do manto protector do Estado. Simples: espontaneamente! Foi assim que aconteceu com a grafia do Inglês e de outras línguas não-reguladas. Foi assim que aconteceu com a notação matemática, com a notação musical, com as próprias línguas (i.e. as suas regras), que evoluem naturalmente e não precisam de decretos para tal. A notação musical, por exemplo, não surgiu tal como ela é hoje; antes evoluiu lentamente ao longo dos tempos — a notação moderna deve-se a Guido d'Arezzo. Pegue-se numa partitura antiga de canto gregoriano e vê-se lá uma partitura que faz lembrar a actual, mas muito mais rudimentar, com menos uma linha horizontal, com menos sinais distintos de duração das notas, etc. Os símbolos matemáticos também evoluíram ao longo de séculos. Geralmente, coexistem notações concorrentes, sobrevivendo uma das alternativas. O maior matemático português de sempre, e um dos maiores do mundo da sua época, Pedro Nunes, inovou a notação matemática do seu tempo, por exemplo. O símbolo de integral, aquele S esticado, porque se trata duma soma, , introduzido por Leibniz, impôs-se naturalmente às alternativas, provavelmente por ser mais prático. Tivesse havido uma autoridade incumbida da escolha do símbolo em vez de terem sido os matemáticos em liberdade e hoje usaríamos talvez uma notação menos prática, embora mais "racional" na opinião dos burocratas que a escolhessem.

Mas voltando às línguas naturais. O Inglês, que apresenta divergências gráficas (e gramaticais) significativas de país para país, não precisa duma ortografia unificada, nem duma regulação legal dela para que haja intercâmbio literário no espaço anglófono. Os livros britânicos são vendidos e lidos sem problemas nos EUA e vice-versa. Alguém imagina os deputados ingleses a aprovarem uma lei que obrigasse os ingleses a escrever color em vez de colour porque senão a variante americana seria preponderante e a variante inglesa seria votada à indiferença? Um cenário surreal. Mas aqui em Portugal as pessoas acham normal que meia dúzia de gramáticos nos queiram obrigar a escrever ótimo e aspeto para as regras ortográficas ficarem mais parecidas com as brasileiras (regendo-se pelas quais os brasileiros continuarão a escrever aspecto, diga-se de passagem). Ora, da mesma forma que os gramáticos devem registar e estudar a língua, aconselhar esta ou aquela forma, os dicionaristas devem recolher os reais usos gráficos nos meios escritos de referência, e não prescrever formas inexistentes, que é o que querem fazer agora.

Por outro lado, a imposição política duma ortografia pseudo-unificada como esta pode contribuir mais para o afastamento das duas normas do que para a sua aproximação. Primeiro, esta reforma introduz muitas divergências até agora inexistentes, como (nova forma portuguesa / forma brasileira, inalterada): aspeto/aspecto, infeção/infecção, conceção/concepção, respetivo/respectivo, receção/recepção, caraterística/característica, etc. Segundo, um maior intercâmbio cultural entre Portugal e o Brasil podia resultar em duas normas mais próximas que as actuais e até mais próximas que as duas novas normas (o Acordo não acaba com a existência de duas normas de facto, uma portuguesa, outra brasileira) decorrentes do Acordo. Uma norma internacional que podia ter emergido naturalmente se o intercâmbio cultural existisse realmente (e não é por causa das divergências gráficas que ele não existe — os livros do José Saramago, do Miguel Sousa Tavares e doutros são lidos no Brasil com a grafia portuguesa; logo, uma ortografia mesmo que fosse igual nos dois países não criaria como que por um milagre esse intercâmbio) e se não tivessem feito a reforma de 1911, para a qual não consultaram o Brasil, podia ter sido baseada na manutenção das consoantes que fossem lidas em algum dos países: Por exemplo, tanto portugueses como brasileiros escreveriam facto, ótimo, aspecto, contacto, ator, etc. Mas isto é uma possibilidade apenas do que podia ter acontecido. Nada como a liberdade para se saber qual a melhor solução.

Não é precisa uma autoridade central para que emerja (ou será emirja?) um padrão na comunicação. (Aqui ia usar a palavra norma, mas já foi contaminada com o sentido de imposição.) O mundo está cheio de exemplos, além daqueles mais académicos que referi em cima. Por exemplo, todos os condutores portugueses usam sinais de luzes para comunicar de formas não previstas no código da estrada. Não foi a DGV nem a Assembleia da República quem inventou o piscar dos máximos para conceder prioridade a quem não a tem, o piscar agressivo "sai da frente", muito menos o sinal "vais passar pela polícia", que consiste em duas piscadelas de máximos com uma duração que emergiu espontaneamente através da interacção livre, espontânea e descentralizada de milhões de condutores. Chama-se a isto ordem espontânea, conceito muito usado por Hayek e outros liberais.

Em Portugal, a tradição política de mudar a ortografia por decreto começou na I República. A produção literária em língua portuguesa dos séculos anteriores sobreviveu à desregulação gráfica, portanto. Foi uma espécie de pecado original, que deu origem à odisseia de desacordos ortográficos do século XX. Não é por acaso que foi um regime socialista e ditatorial o autor da profunda reforma ortográfica de 1911; o mesmo regime que impôs ao país, sem consulta, uma bandeira alheia à identidade nacional (além de pirosa), com as cores do partido único. A desculpa que deram foi a de a tal reforma ser necessária à alfabetização do povo; como se fosse por causa do ph de pharmacia que as criancinhas não conseguiam aprender a ler… Na minha opinião, foi por causa da ausência de democracia e desse analfabetismo generalizado que conseguiram alterar radicalmente a ortografia sem consultar o povo. De facto, a um analfabeto tanto lhe faz que os outros escrevam pharmacia ou farmácia, orthographia ou ortografia, philosophia ou filosofia, lyceo ou liceu, caravella ou caravela, escriptorio ou escritório. A actual reforma em discussão suscita muita mais reacção da sociedade precisamente por esta ser muito mais letrada hoje do que nos idos de 1911. E esta intenção de simplificar a ortografia (algo de que as línguas de cultura prescindiram), em 1911, introduziu uma quantidade considerável de acentos gráficos, cujas regras de utilização pouca gente domina na perfeição. Não é precisa uma entidade reguladora para definir-se uma norma; basta o uso. Não me parece que tenha sido por acaso que tenham sido os fenícios a inventar a escrita alfabética: eram um povo de comerciantes, precisavam da escrita diariamente nos seus negócios. A necessidade levou à solução mais prática: um alfabeto.

A imposição duma ortografia à revelia do povo que a usa pode ter efeitos desastrosos. A quantidade de intelectuais e outras pessoas que se opõem a esta reforma ortográfica devia ser suficiente para que os nossos políticos fossem mais cautelosos. Na verdade, penso que não há nenhuma lei que obrigue à adopção por privados desta ou daquela grafia. Sendo assim, os escritores, as editoras, os jornais, os cidadãos em geral podem recusar-se a deixar de usar a grafia em que aprenderam a escrever e a ler. Podemos acabar por ter meio país a usar esta grafia artificial e a outra metade a usar a actual. A acontecer, seria preocupante. Mas talvez desse caos surgisse uma norma natural e livre. De qualquer modo, o que espero é que, quer por os políticos serem tomados por uma sensatez tantas vezes ausente, quer por pressão da sociedade, este Acordo não venha a entrar em real uso em Portugal. Se os nossos governantes insistirem na asneira, podemos sempre recorrer a uma espécie de desobediência civil, continuando a escrever e a publicar com esta grafia que é nossa. Lancei o repto no De Rerum Natura, e o Desidério Murcho gostou da minha ideia. Espero que agrade a mais gente.

As pessoas têm uma ligação afectiva às palavras, que é tão mais forte quão mais forte é a sua ligação à língua escrita. Não é por acaso que o mais activo detractor do Acordo seja um poeta, Vasco Graça Moura, que tem sido galardoado com vários prémios pela excelência das suas traduções. Os políticos não têm legitimidade para quebrar estes laços afectivos. Além de ser factor de estagnação e de escolhas piores do que aquelas que emergem do uso livre da língua, a legislação da ortografia é antes de tudo uma intromissão ilegítima na liberdade de quem usa a língua e cuja vontade devia ser respeitada, ao invés da vontade da meia dúzia de voluntaristas que decidiu por nós, sem nos consultar. Esta é a razão principal, a liberdade. Deixei-a para o fim porque infelizmente é um argumento que não convence ninguém hoje em dia neste país de súbditos. Um país onde uma das expressões para bom Português é "Português de lei"…

Acordo Ortográfico — é hoje

Como hoje (16/5) se discute na Assembleia da República o Acordo Ortográfico, tenho um bom pretexto para escrever algo sobre um tema que me interessa muito, mas que, talvez por isso mesmo, tenho evitado abordar aqui. É que quanto maior o interesse, mais tenho a dizer; logo, mais trabalho.

Vou publicar aqui alguns textos expondo os meus argumentos contra a adopção do Acordo por Portugal — nos outros países manda quem lá está . O primeiro, já escrito, é sobre o motivo principal que me leva a rejeitá-lo — não faz sentido que se legisle a ortografia. No(s) seguinte(s), enumerarei as várias razões por que rejeito o Acordo.

sábado, 3 de maio de 2008

EuroNews e Boris Johnson

Vi na EuroNews a notícia da vitória de Boris Johnson, do partido conservador britânico, na eleição à câmara de Londres. Ouvi o seguinte, que pode ser lido no site: "Chama-se Boris Johnson, mas há quem lhe chame 'o palhaço'. Uma imagem que parece cultivar"! É a isto que eles chamam informação isenta?! Segue-se de imediato a justificação: terá cometido "gaffes racistas e homofóbicas". Quanto ao racismo, o canal não esclarece, mas não me espanta nada que se refira a alguma verdade incómoda que tenha dito sobre o multiculturalismo ou o islão. Quanto ao tal casamento entre três homens, os activistas gay não conseguirão explicar onde está o mal disso sem entrar em contradição...

Hoje em dia, quem se atrever a importunar as actuais vacas sagradas do politicamente correcto — v.g. o islão e a homossexualidade, e respectivos lóbis — é ostensivamente agredido pelo mainstream. Na EuroNews, isto é o pão nosso de cada dia, como já notei. Não há lá já uma réstia de pudor.

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Gmail português

Ontem reparei por acaso que o Gmail já tem uma versão em Português de Portugal; hoje leio no Público que foi disponibilizada mesmo ontem. Preferi manter a minha conta em Inglês (britânico, para ter datas à europeia), depois de ver que traduziram Archive (no caso, Arquivar) por "Arquivo" (só uma pessoa que não usa o Gmail pode cometer um erro destes!) e Compose mail por "compor mensagem", em vez do normal "escrever". Tivessem copiado a versão brasileira e não teriam feito asneira. Não uso a versão brasileira porque, tal como a nossa, torna a barra da esquerda muito larga (temos tendência para não economizar nas palavras), e fica feio.

Frase do dia

"(...) os jovens são ignorantes porque nascemos ignorantes."

Rui Tavares, no Público de hoje.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Prós & Prós

"O que é isso de maus trabalhadores?", pergunta Carvalho da Silva, no Prós & Contras de hoje, na RTP 1, um debate até agora soporífero sobre o novo Código de Trabalho do governo. Esta pergunta mostra perfeitamente a visão do mundo dos nossos sindicatos. Somos todos bons trabalhadores. De salientar que quase toda a gente que falou até agora partilha a mesma visão do mundo, em que os empresários existem para fazer as vontades aos trabalhadores. Liberdade contratual é um conceito estranho a esta gente.

sábado, 26 de abril de 2008

Preço inflacionado

Estou num hipermercado Feira Nova (maravilhas da tecnologia móvel) e à minha frente está uma grande mesa com centenas ou milhares de livros a preços baixos. Destacam-se, pelo amarelo berrante, várias dezenas de exemplares do livro Barnabé, uma transcrição para papel do defunto blogue homónimo. Ainda pensei em comprar um destes, mas o seu preço, 1 € (um euro), pareceu-me inflacionado. Será uma falha do mercado? Eis uma hipótese para os autores do blogue explorarem...

sexta-feira, 25 de abril de 2008

O país que merecem

Concordo com a análise das eleições directas do PSD que José Miguel Júdice faz hoje no Público, em crónica intitulada "A tábua de salvação". Eu se fosse militante do PSD votava no Pedro Passos Coelho para presidente do partido. Entre ele e Sócrates, em 2009, votava em Coelho sem hesitar. Já entre Sócrates e Manuela Ferreira Leite, tinha de arranjar outra pessoa em quem votar. Como escreve Júdice, são demasiado parecidos. Não há grande vantagem na troca, embora valha sempre a pena mandar Sócrates embora.

O que me surpreende e entristece é a falta de apoio a Passos Coelho por parte dos blogadores (palavra da minha autoria que prefiro a todas as alternativas que já vi) liberais. Então agora aparece um candidato que defende as mesmas ideias que os liberais (e que eu também) têm defendido desde o início, faz aquilo que todos queremos — está mais empenhado em debater ideias do que pessoas —, é duma geração mais próxima da nossa (Ferreira Leite tem 68 anos; Passos Coelho, 44), e eles vêem na senhora a salvação do partido e da pátria? Não consigo perceber. São capazes de se entusiasmar com uma tal de Ron Paul revolution que não nos afecta em nada e não demonstram um mínimo de entusiasmo pelo político com vontade de ser primeiro-ministro mais liberal da nossa praça e com muito mais hipóteses de ser bem-sucedido do que o simpático médico americano. Tanto tempo despendido a execrar os nossos políticos e mentalidade socialistas, a lamentar a ausência de propostas políticas liberais e agora que há a possibilidade de pelo menos essas ideias ganharem projecção nacional, desprezam-na. A consideração que tinha por eles caiu a pique. É caso para dizer, e digo-o com tristeza, que têm o país que merecem.

Um problema lógico-psicológico

No sempre interessante De Rerum Natura, leio hoje uma transcrição dum capítulo do novo livro de Nuno Crato, A Matemática das coisas (Gradiva), intitulado As fatias do bolo-rei, que trata do problema de dividir um bolo por várias pessoas sem que no final alguém possa alegar ter sido injustiçado. Um problema interessante, sem dúvida. (Vá ler o texto, bem curto, antes de ler o seguinte:)

Esse problema foi tratado num episódio duma série infantil dedicada a esse género de problemas chamada "Aqui há gato". Via-o regularmente em criança, acho que na RTP 2. Não tenho a certeza, mas acho que era apresentado pelo Pedro Ribeiro.

Primeiro deram a solução para duas pessoas. A partir do dia em que o vi, usei sempre que podia o método quando o problema surgia no mundo real. Depois deram a solução para 3 pessoas, cujos pormenores infelizmente esqueci. Mas lembro-me de que não era usado o "método da faca deslizante", descrito no livro. Usava-se uma moeda para escolher a ordem de decisões, mas sem introduzir injustiça, claro. (Por exemplo, podemos usar uma moeda para o caso de duas pessoas sem injustiçar ninguém.) Mas o mais importante é que havia uma iteração em que se desenhava um corte, sem haver propriamente um corte duma fatia. Um dos participantes escolhia uma das partes virtuais. Numa iteração posterior, esse corte era redesenhado por outro participante.

Não me lembro do método. Se alguém o conhecer, era interessante que o expusesse aqui na caixa de comentários.

Nessa série lembro-me também de ver um daqueles problemas de obter uma medida dum líquido a partir de dois recipientes de medida conhecida mas sem graduação. E muitos outros problemas matemáticos divertidos.

Mas um problema que me fascinou e que nunca mais esqueci foi este:

Três pessoas tomam chá. Outra pessoa colou três cartões coloridos debaixo de cada chávena. Os jogadores sabem que há disponíveis cinco cartões: 3 vermelhos e 2 pretos, mas desconhecem as cores escolhidas pelo jogador exterior. Os jogadores ao beberem vêem os cartões por debaixo das chávenas dos outros, mas não vêem o seu próprio cartão. Ganha quem acertar primeiro na cor da sua chávena. Ora nesse episódio é mostrada a perspectiva dum dos jogadores, que vê que os amigos têm ambos um cartão vermelho. Nenhum deles arrisca uma resposta. Tendo em conta que os amigos são ambos inteligentes, o jogador da nossa perspectiva descobre a solução. Deixo aqui o desafio aos meus leitores de descobrirem qual a cor desse jogador e que raciocínio seguiu que lhe permitiu chegar à conclusão. É uma espécie de problema lógico-psicológico.

Ah, fiquei com vontade de comprar o livro. Do Nuno Crato só li o livro O "eduquês" em discurso directo (Gradiva), que é muito bom e cuja leitura aconselho veementemente.

terça-feira, 15 de abril de 2008

EuroNews e Berlusconi

A EuroNews não consegue disfarçar a desilusão por Silvio Berlusconi ter vencido as eleições em Itália ontem. É muito engraçado. Mas mesmo assim, ainda tentam disfarçar. Antes da eleição, o ódio a Berlusconi era muito mais evidente.

Alguém ainda leva este canal de propaganda a sério? Pode ser engraçado ver a mentalidade oficial europeia concretizada em cada notícia, mas acaba por se tornar chato e previsível. Que a RTP emita horas daquele canal é sintomático do papel doutrinador da TV do Estado português.

Prós & Contras VI

Quem não viu o debate pode vê-lo online (será que o acordo preconiza a opção "em linha"? Eu gosto de "em linha", mas pergunto-me: o acordo não é só sobre ortografia?) aqui. (Não encontro link directo.) Agradeço a indicação do link ao meu amigo Marco Aurélio Antunes, que, apesar de brasileiro, também é contra o acordo.

Hoje estou de parabéns. Todos estes posts foram enviados por telemóvel.

Prós & Contras V

Notas soltas.

Terminou o debate. O Reis dá vontade de rir até ao fim. Dizia ele que os livros não vão para o lixo, mas sim substituídos. Será que vão ser emendados?

Uma escritora brasileira começou a sua intervenção dizendo que ia fazer umas "colocações".

Só na última intervenção Vasco Graça Moura menciona os livros que ficarão inutilizados. Porque é que não apresentaram os argumentos todos logo no início?

Quem não conhecia as alterações introduzidas pelo acordo ficou sem conhecer. Esse era o papel dos apoiantes do acordo. Mas os opositores também podiam ter feito esse serviço. Eu pensava que estava informado, mas agora fiquei com dúvidas. Pensava que íamos passar a escrever "aspeto" e "ato", mas depois do que disse VGM, depreendi que não é certo. Vou ter de consultar o texto do Acordo. Mas receio que não me vai esclarecer muito. A introdução das ditas facultatividades é um inegável desastre.

Leio no blogue Portugal dos Pequeninos alguma contextualização à personagem Carlos Reis. Mas que homem insuportável! Aquele permanente ar de superioridade acompanhado por um sorriso cínico, os gestos, o virar do corpo para a plateia, as sobrancelhas franzidas acompanhando aquele sorriso condescendente de mente superior, o estar sempre a apontar lapsos irrelevantes nos outros, a constante adjectivação do outro ("superficialidade intelectual", etc.), os constantes "caro amigo", e outras hipocrisias de fraco nível, etc., tudo no homem é insuportável!

Antes do debate escrevi um texto para publicar aqui, que não acabei ainda, resumindo as minhas razões para rejeitar este acordo. Algumas coisas foram ditas por eles, mas nem tudo, pelo que quando o acabar ponho-o aqui.

Prós & Contras IV

Está quase a acabar o debate e apenas agora a Alzira Seixo aborda ao de leve a questão da evolução natural da ortografia, que deve preceder as reformas, isto deixando passar como pacífico que faça sentido regular por lei a ortografia.

Prós & Contras III

Só agora se fala no Inglês, que nunca teve ortografia oficial. Só agora...

De notar o bom humor com que Vasco Graça Moura reage à arrogância e ataques do Carlos Reis. Ponto para ele! Eu não reagiria assim...

Este Reis é insuportável. Deve pensar que é o maior. É "é assim", diz ele!

Prós & Contras II

Só agora aparece alguém com uma crítica pertinente e óbvia ao acordo: a questão da frequência das palavras com grafia alterada. Só agora falam nisto... Foi um linguista, António Emiliano.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Prós & Contras

Uma desilusão, o debate no Prós & Contras até agora sobre o nefasto acordo ortográfico.

Ninguém até agora se lembrou de dizer que o Estado devia manter-se fora da ortografia. Parece consensual que a lei deva dizer que se escreve assim ou assado, mas não é! Pobre país.

Os opositores ao acordo estão a fazer um mau trabalho. Não estão a ser sistemáticos, não se lembraram de muitos argumentos contra o acordo. O Vasco Graça Moura perde tempo com pormenores e tem péssima dicção. Sinceramente, preferia ter ido lá eu a ver esta tristeza.

De notar a arrogância do Carlos Reis a falar em ridículo, desonestidade intelectual, etc.

Voltarei ao tema.

sábado, 29 de março de 2008

«Populista libertário de extrema-direita»...

... é assim que Paulo Moura classifica Geert Wilders hoje no suplemento P2, do Público. Extrema-direita libertária... Estamos sempre a aprender.

Cenas da televisão pública

Mais uma história para acrescentar ao tema do "serviço público de televisão":

«(...) Ora, no muito interessante debate que se lhe seguiu (voltarei a ele amanhã) disse-se, por exemplo, que há público para o teatro sério. Então, se há público para o teatro sério e se se faz tanto bom teatro sério em Portugal, porque é que se transmite em directo uma comédia chamada O Dia das Mentiras que perpetua a imagem do teatro português como uma coisa revisteira e rasteirinha? (...)»

As boas intenções (1), de Jorge Mourinha, no Público de hoje.

Já eu acrescento uma pergunta: se há público para o teatro sério e para o popular obviamente que há , então porque é que passam a vida a pedir subsídios para o teatro?

A Esquerda e a moral

O artigo do João Miranda no DN de hoje é dos melhores que ele escreveu naquela coluna. Como é pequeno, transcrevo-o na íntegra. Destaques meus.


«Vícios e Virtudes

O Partido Socialista quer acabar com o conceito legal de culpa no divórcio. Isto é, quer transformar o casamento num compromisso sem compromissos. Este é o mesmo Partido Socialista que quer proibir os piercings na língua e que aprovou uma nova lei do fumo com o objectivo declarado de combater o vício. Entretanto, o Bloco de Esquerda, um partido que chegou ao Parlamento graças à defesa do aborto e das drogas leves, tem um projecto de lei para proibir a publicidade ao álcool no desporto. Graças ao empenho dos partidos de esquerda, os portugueses terão no futuro mais facilidade em romper um casamento ou fazer um aborto do que em fumar um cigarro, publicitar uma cerveja ou meter um piercing na língua.

A defesa de instituições e de regras que têm como objectivo proteger as pessoas delas próprias costumava ser uma característica das religiões tradicionais. Os partidos progressistas, como o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista, começaram por contestar a autoridade religiosa com base na defesa da liberdade de cada um para tomar as suas próprias decisões. Mas agora que chegaram ao poder, desprezam a liberdade individual e limitam-se a substituir uma moral arbitrária por outra. A Igreja Católica tolerava o fumo e era contra a carne na Quaresma. O Partido Socialista tolera a carne na Quaresma mas embarcou numa campanha moralista contra o fumo. Neste contexto, a ASAE funciona como uma espécie de polícia do vício e da virtude. A ASAE não serve só para detectar carne estragada que nenhum consumidor estaria disposto a comer. Serve também para nos proteger de estabelecimentos que gostaríamos de frequentar e de produtos que gostaríamos de consumir. Ironicamente, uma das funções da ASAE é garantir que os hipermercados não abrem ao domingo à tarde. O domingo é um dia consagrado à família, quer os portugueses queiram quer não queiram. Claro que, graças ao projecto de lei do PS, os portugueses poderão agora dissolver a família sem culpa. Ficarão sem nada para fazer ao domingo à tarde.»

Esta última frase é deliciosa...

Ban Ki-moon, o Freitas da Coreia

Como o site que publicou o documentário Fitna o retirou dos seus servidores por os seus funcionários estarem a ser ameaçados de morte, substituí a fonte do vídeo ali em baixo por uma do Google Video.


Ban Ki-moon

Mas outra coisa triste nesta história foi a reacção infelizmente pouco surpreendente do secretário-geral dessa coisa de utilidade duvidosa chamada ONU, Ban Ki-moon :

"I acknowledge the efforts of the Dutch Government to stop the broadcast of this film and appeal for calm to those understandably offended by it. Freedom must always be accompanied by social responsibility." (in Un News Centre)

Ou seja, a ONU é a favor da censura prévia! Será que isto ainda pode piorar? Suponho que sim. O senhor Ban diz que é de compreender os que se sintam ofendidos com o vídeo. O facto de o vídeo apenas mostrar factos verdadeiros, citações rigorosas do Alcorão e dar a voz aos próprios muçulmanos parece-lhe irrelevante. A verdade não interessa para nada, o que interessa é que quem não gosta de a ouvir se sente "compreensivelmente" ofendido. Por isso, proíba-se de se dizer a verdade, a bem da hiper-sensibilidade violenta dos fanáticos.

Depois vem aquilo da "responsabilidade social", que ninguém sabe bem o que é, mas a que Ban acha que a liberdade de expressão se deve submeter. Ainda iremos ouvi-lo falar de "licenciosidade", conceito moralista transformado em político-filosófico por Freitas do Amaral aquando do episódio das caricaturas de Maomé. A escola é a mesma.

Freitas do Amaral

sexta-feira, 28 de março de 2008

Fitna, finalmente

Foi lançado ontem na Internet o muito aguardado documentário do político holandês Geert Wilders sobre o carácter intrinsecamente violento do islão. O filme chama-se Fitna, uma palavra árabe de impossível tradução que quer dizer, entre outras coisas, "discórdia". Ainda não havia uma só imagem do filme conhecida e já a Al-Qaeda tinha posto a cabeça de Wilders a prémio e muitos muçulmanos por todo o mundo queimavam bandeiras da Holanda... O próprio governo holandês tentou censurar o filme, em vão. O filme está também guardado no site WikiLeaks, além do próprio LiveLeak, onde foi oficialmente publicado, já que parece que o YouTube e outros serviços têm feito todos os possíveis por censurá-lo. É triste quando chegamos a este ponto de auto-censura...

O filme dura apenas 16 minutos e é de visionamento obrigatório! Está legendado em Inglês. Ei-lo:

Adenda, 29-03-2008: A LiveLeak retirou o vídeo porque os seus funcionários foram ameaçados de morte. Nada que nos espante. O vídeo está no Google Video e é dessa fonte que se reproduz o vídeo aqui em baixo (antes era do sítio original, a LiveLeak). Esperemos que a Google não ceda a chantagens. Se ceder, a liberdade de expressão terá acabado na prática e a barbárie terá vencido. A Wikipedia é o melhor sítio que conheço para seguir a história. A discussão sobre a página é de acompanhar também.


quinta-feira, 6 de março de 2008

A vergonha é quando o homem quiser

Mais notícias de solidariedade árabe, destaque meu:

Egipto inicia construção de muro na fronteira com a Faixa de Gaza
06.03.2008 - 17h24 AFP

O Egipto começou hoje a construir um muro ao longo da fronteira com a Faixa de Gaza, semanas depois de milhares de palestinianos terem passado a frágil vedação que separa os dois territórios para fugir ao bloqueio israelita.

Segundo uma fonte dos serviços de segurança israelitas, que falou à AFP sob condição de anonimato, o muro terá três metros de altura “ao longo de toda a fronteira com a Faixa de Gaza”.

Estou certo de que o Miguel Portas e camaradas não tardarão a condenar mais este "muro da vergonha".

Obama, 'kitsch' e os artistas

Milan Kundera escreveu, no excelente romance A Insustentável Leveza do Ser, se não me falha a memória, que o kitsch é inevitável na política. Não sei o que ele acha de Barack Obama, mas a mim este parece-me a encarnação perfeita do kitsch na política; um kitsch sofisticado, como muito do kitsch na história da arte, mas, ainda assim, kitsch.

A histeria à volta do candidato por causa do seu tom de voz, bom aspecto, e repetição ad nauseum de expressões vazias que não concretiza já me enjoa há muito. Mas acho que só agora, depois de ver o vídeo em baixo, me ocorreu a expressão "kitsch" e com ela a memória da passagem de Kundera que evoquei. Note-se que todos os participantes do vídeo são artistas — uns músicos, outros actores, outros ambas as coisas. Não aparece ninguém que não o seja. Este facto corrobora o que disse acima — são os artistas quem lida no seu trabalho diariamente com o kitsch e, por isso, são também os mais sensíveis a ele. É por isso compreensível que haja tanto artista entusiasmado com o boneco falante. Temos de compreender.

Os 200 anos da chegada da corte portuguesa ao Brasil e o antilusitanismo brasileiro

A professora insurgente

Vejo numa reportagem na SIC Notícias sobre os protestos dos professores contra a ministra da educação (não faz sentido usar iniciais maiúsculas aqui) uma professora explicando qualquer coisa que não retive porque estava a olhar para o seu keffiyeh — aquele pano axadrezado que os árabes tradicionalmente usam na cabeça e que alguns ocidentais "pacifistas" em prol do terrorismo usam ao pescoço para se proteger do frio e do bom-senso — e para o cartaz que trazia atado ao pescoço, e pergunto-me: «Será que os professores vão começar uma Intifada contra a ministra?» Ódio não falta...

quarta-feira, 5 de março de 2008

Logo hoje...

Hoje, o Público faz 18 anos e o José Pacheco Pereira é director por um dia. Interessante. Só é pena que com a emoção se tenham esquecido de colocar em linha o suplemento P2, que hoje até traz um texto do Miguel Esteves Cardoso em que este escreve sobre o que odeia no jornal. Alguém dê um toque ao JPP...

Adenda, 6-3-2008: Afinal, o P2 está disponível, e em PDF, bem como o restante jornal. Aqui.

Somos todos democratas



No site de notícias da RTP, vejo isto escrito (a imagem acima é recortada do meu ecrã):

Hillary Clinton venceu e McCain garante nomeação
A senadora democrata Hillary Clinton venceu as primárias no Texas, Ohio e Rhode Island.

John McCain garantiu a nomeação e será o candidato democrata à Casa Branca.


Já sabíamos que para a generalidade dos nossos media, só os candidatos democratas são os correctos e os que interessa acompanhar. Há lapsos que revelam muito...

Dupla vitória para McCain

(imagem roubada daqui)

Esta noite foi de dupla vitória para McCain: ganhou a nomeação republicana para a presidência e viu adiada a decisão democrata, o que aumenta grandemente as hipóteses de o partido democrata continuar dividido até ao fim, contribuindo para a eleição presidencial de McCain.

Ron Paul também está de parabéns hoje.